Com o toque de acolher, precisamos não só coibir que os adolescentes estejam nas ruas a partir de determinados horários, em situações de risco, mas também precisamos incentivar os jovens a irem para as escolas. Precisamos incentivar ou obrigar os pais a matricularem seus filhos, até porque a evasão escolar é uma preocupação mundial, haja que até a Convenção Dos Direitos da Criança obrigam os Estados –partes, dentre ele os Brasil, a tomar medidas para o combate da evasão escolar.
A relação delinquência – baixo nível intelectual é algo tão óbvio que, parece até que estou sendo tautológico ao escrever este artiguete.
Em Santo Estêvão_Ba, conforme dados da Delegacia, nos últimos 75 atos infracionais (crimes cometidos por menores de 18 anos) registrados, 71 (94%) foram praticados por menores que eram analfabetos, ou só possuíam parte do 1º grau ou haviam abandonado a escola.
O Código Penal contra os pais negligentes pode nos ajudar muito no combate a este “câncer social” que é a evasão escolar na Bahia.

O que é o abandono intelectual para o direito penal?

O abandono intelectual, segundo o Código Penal Brasileiro, é um crime cometido pelos pais que deixarem de proporcionar aos seus filhos à instrução primária, ou seja, acontece quando os pais não matriculam os filhos, na idade escolar, nos estabelecimentos de ensino da rede pública ou da rede particular.
Com a nova Emenda Constitucional de nº 59/09, houve profundas alterações no que pertine à “idade escolar” para se saber quando, em que momento, em suma, com que idade dos filhos poderíamos constatar que os pais estariam incursos nas penas do crime de abandono intelectual.
Vejamos o referido Código:

Abandono Intelectual

“Art. 246. Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar:

Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa.

Não confundamos este crime com o delito do art. 244 do Código Penal (abandono material), que ocorre quando os pais deixam de prover a subsistência (prestar os recursos necessários os filhos, dentre outros, sobrevivam. O crime de abandono material se refere aos recursos para a subsistência (sobrevivência).
Entretanto, quando os pais não mandam os filhos em idade escolar, sem justa causa, à escola, existe o crime de abandono intelectual.
A obrigação vem, primeiramente, no Código Civil, segundo o qual, em seu art. 1634, aos pais compete, quanto à pessoa dos filhos menores: I - dirigir-lhes a criação e educação”.
O direito à educação não é só oriundo de mandamento em nível legal. Trata-se de uma exigência constitucional, pois o art. 227 da CRFB/88 determina que:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Por sua vez, art. 208 da CRFB/88, diz que o Estado tem o dever de garantir o ensino fundamental (primeiro grau) obrigatório e gratuito. O dever do Estado é construir e prover vagas nas escolas.
O crime de abandono intelectual, portanto, configura-se quando os pais, sem justa causa, deixam de garantir a instrução primaria dos filhos em idade escolar. Havendo escolas, a obrigação dos pais é mandar os filhos à escola.
“Se o Estado não criar escolas (ou se não houver vaga), pode-se recorrer ao Ministério Público. Segundo o art. 129 da CRFB/88, uma das funções do MP é a defesa dos interesses coletivos e dos interesses individuais homogêneos. A escola é um interesse, pelo menos, individual homogêneo. O MP poderá entrar com uma ação civil pública ou com um mandado de segurança contra o ente federativo (pois tal dever é concorrente) exigindo este direito” (http://www.licoesdedireito.kit.net/penal/penal-abintelectual.htm).

Detalhes do crime:

Objeto JURÍDICO PROTEGIDO: o direito de os filhos menores de 18 anos terem acesso a uma formação intelectual básica (ensino de 1º grau) ;
SUJEITO ATIVO DO CRIME: APENAS os pais. A criança e o adolescente estão, até os dezoito anos, sob o poder familiar, que é exercido pelos pais. O tutor, então, não teria o dever de mandar o menor à escola, pois o legislador não considerou o tutor como sujeito ativo deste crime (só há previsão legal quanto aos pais). Não há como encaixar o tutor como sujeito ativo deste crime, devido ao princípio da legalidade (art. 1º do CP), não podendo se fazer interpretação extensiva ou analógica em se tratando de norma penal incriminadora, pois não cabe analogia in malam partem no direito penal. O ascendente deve prover a instrução fundamental, ainda que o filho não esteja em sua companhia; se os pais são separados, e o filho mora com a mãe, e esta não o manda à escola, ela estará praticando o crime de abandono material, mas se o pai, que sabe da situação e nada faz, também estará praticando este crime, porque ele continua no exercício do pátrio poder. O pai, neste caso, pode atravessar uma petição ao juiz da vara de família dizendo que seu filho está em idade escolar e não está indo à escola e pedindo que a mãe dele, que tem a guarda, o mande à escola ou dê a sua guarda para ele. Se o pai se omite, ele responderá também pelo crime((http://www.licoesdedireito.kit.net/penal/penal-abintelectual.htm).
SUJEITO PASSIVO: filhos em idade escolar. A idade escolar é dos 4 aos 17 anos.
Para se chegar à conclusão de que o ensino fundamental compreende a educação de primeiro grau, e que a idade escolar vai dos 4 aos 17 anos, deve-se recorrer à Emenda Constitucional nº59/09, que derrogou parcialmente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96). O art. 6º desta lei determinava que os pais tinham que prover a matrícula obrigatória dos filhos menores a partir dos 6 anos, no ensino fundamental obrigatório, que tinha a duração mínima de 09 anos. Com a mudança proporcionada pela Emenda Constitucional nº 59/09, portanto, a criança, iniciando os estudos aos 4 anos, terá 14 anos de escolaridade. O ensino fundamental, portanto, abrange o primário e o ginásio (primeiro grau).

CONDUTA:

• O tipo penal fala em "deixar de prover instrução” : com este verbo “deixar de “, evidencia-se que é praticado por omissão, e só pode ser praticado pelos pais: é um crime omissivo próprio. Referido crime se configura em razão de um comportamento negativo: o sujeito ativo (pai ou mãe) deixa de fazer aquilo que ele tem obrigação de fazer.
O crime se consuma no instante em que começa o ano letivo, e o filho não é matriculado.
• Não admite tentativa (o crime omissivo próprio não admite tentativa).
O tipo penal fala em "sem justa causa". Trata-se de elemento normativo do tipo (exige um juízo de valor). Sendo a causa justa, o crime não existirá, pois faltará uma das suas elementares ("sem justa causa"). Se o pai não matricula o filho porque não existe escola no local, a causa é justa. Se o pai não matricula porque não há vaga, a causa é justa. Se os pais não matriculam porque o local é inacessível ao transporte público no local, a causa também é Just para pois que não tenham condições de pagar condução particular. Nestes casos, quem falhou foi o Estado, e não o pai. O pai não pode deixar de matricular o filho porque a escola é longe e ele não tem condições financeiras de enviá-lo, pois atualmente ele pode contar com passagens gratuitas e com outros benefícios ("Bolsa Família, por exemplo) ((http://www.licoesdedireito.kit.net/penal/penal-abintelectual.htm).

1 Comentários

  1. No Brasil só mesmo alguém com muita audácia e alma nobre para combater de cara limpa e honesta a violência e os males que a sustentam. Alguém que mesmo diante de um cenário tão devastador e desolador não se intimida, e exerce com mérito uma função que há muito vem sendo desprestigiada no nosso país.
    Você, Meu Caríssimo, merece nossos aplausos pela iniciativa da adoção do Toque de Recolher, e por sua árdua defesa, ato que nos faz voltar a ter esperança e confiança num dos Poderes há tanto desacreditado nesse país, mas, absolutamente indispensável a manutenção de qualquer Estado Democrático de Direito.
    Parabéns!
    Ceomara Ribeiro Brandão Mota

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